sexta-feira, 29 de abril de 2022

Uilcon Pereira: No Coração

Este baú-arquivo-pirâmede

                                    

                                           Aricy Curvello

 

Os textos aqui apresentados permitem responder a interrogações, não a todas, a respeito do homem e do escritor. Regiões permanecem, a que(ainda) não temos acesso. A prematura morte de Uilcon Pereira fez encerrarem-se várias possibilidades, e é certo que nos abalou, porque, em um momento de invenção e crescimento de sua obra e de seu nome, e ele foi abatido em pleno voo, na hora mais clara.

Ele que nos dizia com aquela sua graça peculiar: “Sou contra a rotina e remo contra a corrente”. Eternamente insatisfeito, provocador, sal disponível. Não há quem o tenha conhecido que dele possa esquecer-se facilmente.

“Você se inventou  como personagem” – é um trecho de carta de Fábio Lucas  a ele que, sintomaticamente, o incluiu como epígrafe em algumas publicações.

O processo de invenções dessa persona decorreria da espécie de ficção que ele escreveu – em que, de certa f0rma, também ele “se” produziu.

Uma de suas grandes linhas de força: não ter separado vida e arte em departamentos estanques. Intercruzava ambas. Por vezes a ficção “vivia” a vida de Uilcon e vice-versa, não bastasse já ser ele cursor da intertextualidade (Elisa Guimarães) e da intersubjetividade (Antônio Medina Rodrigues).

Mário Bolognese, ex-aluno em Assis e hoje professor de Filsosofia na INESP/Campus Marília, mostrou-nos em Do Esteta Ao Literato o quanto ele esteve alerta e atento desde cedo: “Cético o suficiente, o professor que veio ajudar a instalar o curso de Filosofia na UNESP (em Assis) não esmorecia   diante de uma polêmica. Se abandonou os temas clássicos da Estética para adentrar a pretensa ciência da linguagem de então (Linguística e Semiologia, resultado da presença estruturalista entre nós), o fez procurar uma materialização sígnica para conceitos inefáveis, que, em sua opinião, nada tinham a dizer”.

A estrutura oscilante que se desfaz (pontada no ensaio Babilônia, Babel, Bizâncio e Brasil) corresponderia à materialização sígnica para conceitos inefáveis que, em sua opinião, nada tinham a dizer” ( Mário Bolognese) e ao esclarecer tópico de Antônio MedinaRodrigues: “Daí que as vozes, que se multiplicavam  em seus livros, jamais quiseram dizer  alguma coisa.

Não tinham tempo. Só queriam ser uma construção inter-humana, um “passa-passa-treze”, e essa para ele, era a mais digna das objetividades... Evitou a substância opaca. Preferiu a escrita pluribucal, pedestre, acirandada. De que falava ele? Sempre se fala de alguma coisa. Mas, no caso dele, as palavras eram estugadas a mais não poder, para não se tornarem mesquinhas ou virginais em excesso, para não roubarem o verdadeiro espetáculo, que estava na própria ânsia de vida...”

Tais seriam as sendas mais próprias para se chegar ao cerne da ficção de Uilcon?

Este baú-arquivo-pirâmede – afinal, que gênero literário é este? – tem várias razões de ser e várias respostas diferentes. Tantas, quantos são os autores  aqui reunidos para lembrar Uilcon.

Lembremos também suas cartas, porque até aqui ele foi genial (genial, sim) e conseguiu iniovar  em gênero e trechos transcritos por Camilo Mota, por Hygia e por Ricardo Lima, é possível perceber o grande dom de Uilcon de se fazer próximo, quase íntimo de alguém pouco conhecido, e de assim  falar à subjetividade do outro. Esse o dom a que Uilcon chamava de “cumplicidade”.

Significativamente, ele emprestou a seu próprio trabalho também um caráter de manifestação marginal. Como escritor identificava-se com tudo o que estivesse à margem, pois ele (multíplice) também se considerava à parte, junto com  trabalho que realizava.

Uilcon se agilizava de uma voz a outra. Como escreveu Antônio Medina Rodrigues: ... para que o texto não tivesse princípio nem fim, e a cidade não dormisse além da conta. Mas agora ele dorme. Que faremos sem ele?  


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